Sítio do Piropo

B. Piropo

< Jornal Estado de Minas >
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11/07/2002

< Jatos de Tinta >


Artigo publicado no suplemento Informátic@ do Estado de Minas em 11/07/2002

Por que custa tão caro substituir os cartuchos das impressoras tipo "jato de tinta"?

Essas impressoras, que se tornaram populares a partir dos anos noventa, imprimem lançando microscópicos jatos de tinta sobre o papel para gerar pontos com cerca de 50 milésimos de milímetro de diâmetro, menores que a espessura de um fio de cabelo. O jato é produzido por bocais ligados a cartuchos de plástico que se movimentam em frente ao papel. A cada cartucho corresponde um conjunto de bocais denominado "cabeça de impressão". Enquanto o papel permanece imóvel, os cartuchos e suas cabeças de impressão percorrem toda a largura da folha "cuspindo" gotículas de tinta através dos bocais para imprimir uma faixa de cerca de 12 mm. Em seguida o papel se desloca verticalmente, um novo movimento das cabeças imprime a faixa seguinte e essas ações se repetem sucessivamente até que toda a folha seja impressa. O mecanismo da impressora permite que os pontos sejam aplicados com extrema precisão, misturando proporcionalmente três cores primárias para gerar nuances de qualquer cor.

O conceito da "cor" para ser exibida em um monitor é diferente daquele adotado em uma impressora, que deve gravá-la sobre o papel. Isso porque monitores são fontes de luz e geram cores emitindo intensidades proporcionais de vermelho, verde e azul, as três cores primárias aditivas, que são "somadas" pelo olho. Já o papel não emite, mas sim reflete a luz que recebe. Portanto, as cores devem ser criadas através da mistura proporcional de ciano, magenta e amarelo, as três cores primárias subtrativas, pois a sensação de cor deve ser gerada retendo (ou "subtraindo") determinados comprimentos de onda da luz branca refletida. Mas, por mais complicado que isso pareça, não deve preocupar o usuário: tudo é feito por software, mais especificamente pelo "driver" da impressora (veja mais detalhes nos artigos sobre Inkjet Printers em
<http://web.nut-n-but.net/CCPCUG/TechBriefs.html>).

O processo se desenvolve em dois estágios. No primeiro converte-se as proporções de cores primárias aditivas (ou representação RGB, de Red, Green, Blue) em proporções equivalentes de cores subtrativas (ou representação CMY, de Cyan, Magenta, Yellow) para  gerar no papel a mesma tonalidade que seria originada no monitor. Depois o driver gera comandos que serão transmitidos à impressora e dispararão os jatos de tinta de cada cor na proporção e no local exatos para imprimir o ponto na posição e cor desejadas. Para realçar as cores escuras e produzir uma cor negra suficientemente encorpada,  as impressoras comuns usam um cartucho de tinta preta além do cartucho com três reservatórios para as cores primárias. As melhores usam quatro cartuchos, um para cada cor. E as mais sofisticadas usam ainda dois cartuchos adicionais, ciano claro e magenta claro, para lograr maior suavidade em nuances mais claras. Mas todas usam o mesmo princípio: cartuchos carregados de tinta que se deslocam em frente ao papel e,  através de microscópicos bocais situados em suas cabeças de impressão, disparam jatos de tinta preta ou colorida para imprimir pontos nas cores e nos locais desejados.

Qualquer pessoa que já tenha tirado pasta de dente de um tubo sabe que para fazer um fluido atravessar um bocal basta aplicar pressão do outro lado. E se a pressão for demasiada, o fluxo se transforma em um jato. Pois é justamente assim que os jatos de tinta são gerados: aplicando pressão a uma câmara que contém um pequeno volume de tinta, ligada ao cartucho e situada em frente a um bocal. Os grandes fabricantes de impressora usam meios diferentes para isso. A HP, Lexmark e Canon adotam a tecnologia térmica: uma micro resistência situada junto ao fundo de cada câmara aquece rapidamente e vaporiza parte da tinta. O súbito aumento de volume gera a pressão necessária para expulsar a tinta através do bocal, provocando o jato. A saída da tinta cria o vácuo que suga tinta do cartucho, enchendo novamente a câmara. Já a Epson usa a tecnologia piezelétrica, por ela patenteada. Um cristal piezelétrico tem a propriedade de gerar uma tensão elétrica quando submetido a uma pressão (e por isso são usados para produzir faíscas nos isqueiros "sem pedra" e nos acendedores tipo "magiclick") e, inversamente, expandirem-se, gerando uma pressão, quando submetidos a uma tensão elétrica. Nas impressoras jato de tinta da Epson, uma das paredes da câmara é constituída por um cristal piezelétrico. Basta aplicar uma tensão no instante correto para gerar uma pressão proporcional a ela, que expulsa exatamente a quantidade desejada de tinta da câmara através do bocal. Uma tensão de sinal inverso suga a tinta do cartucho, reenchendo a câmara (veja a descrição de ambas as tecnologias, com diagramas esquemáticos, em <www.pctechguide.com/13inkjets.htm>).

Cada tecnologia apresenta suas vantagens e desvantagens. A térmica, devido às sucessivas mudanças de temperatura a que câmara e bocais são submetidos, faz com que as cabeças de impressão durem menos. A piezelétrica é mais duradoura, porém mais cara. Por isso as cabeças de impressão das impressoras HP, Lexmark e Canon fazem parte dos cartuchos e são substituídas com eles (ou seja: cada vez que se troca os cartuchos, joga-se fora as cabeças). Já a Epson mantém a cabeça na impressora e o cartucho substituído é apenas um reservatório de tinta (mas se houver um dano nas cabeças, o preço do reparo ou troca é tão elevado que em geral é melhor comprar outra impressora).

A qualidade da imagem depende da precisão com que a tinta é aplicada ao papel e da qualidade da tinta e do papel. Para as impressoras modernas, tanto as que usam a tecnologia térmica quanto a piezelétrica, o primeiro ponto não é mais problema: elas aplicam a tinta  com uma resolução e precisão admiráveis. Resta a questão da tinta e do papel.

O papel não é produzido pelas fabricantes de impressoras (mesmo os de "marca", são fornecidos a elas sob encomenda). Portanto, basta escolher o papel correto e ajustar as propriedades de impressão de acordo. Já a tinta deve obedecer a especificações bastante severas. Por exemplo: a tinta usada nas impressoras térmicas deve ser estável em altas temperaturas, o que não é tão importante no caso das que usam tecnologia piezelétrica.

Os fabricantes recomendam usar sempre os cartuchos originais, por eles fabricados, e jamais reutilizá-los. Nas impressoras térmicas isso corresponde a jogar fora um conjunto de cabeças de impressão ainda perfeitamente funcional após o primeiro uso. Como há quem afirme que as cabeças podem ser usadas pelo menos três vezes, alguns usuários reutilizam os cartuchos. Mas nesse caso convém usar tinta de boa procedência. Há quem compre cartuchos novos, porém fabricados por terceiros. Nas impressoras térmicas, isso corresponde a comprar cabeças fabricadas por terceiros (e que, se não forem de boa qualidade, podem afetar a qualidade da impressão). Nas piezelétricas, isso corresponde apenas a comprar tinta fabricada por terceiros (a cabeça de impressão das Epson, a única que usa essa tecnologia, fica na impressora). Mas, nesse caso, se a tinta não for de boa qualidade e provocar danos irreversíveis à cabeça, o preço da reposição é equivalente ao de uma nova impressora.

Os preços das impressoras, mesmo as de boa qualidade, vêm acompanhando a tendência do mercado de informática e caindo cada vez mais. Enquanto isso, o dos cartuchos originais praticamente se mantêm estáveis. Já os cartuchos "remanufaturados", fabricados ou reenchidos por terceiros, custam uma fração do preço dos originais.

O preço de fabricação da tinta (me refiro à de boa qualidade) é inferior a dez dólares o litro. Os cartuchos disponíveis no mercado contém de vinte a cinqüenta mililitros de tinta e, os originais, são vendidos por preços superiores a vinte dólares, chegando a mais de quarenta. Se considerarmos que no caso da Epson, os cartuchos são meros reservatórios de tinta (nas demais, contém também as cabeças, mas convém lembrar que cabeças térmicas são baratas), não conheço negócio melhor. Ou seja: do ponto de vista de "fazer negócio", as grandes fabricantes de impressoras não vendem impressoras. Elas vendem tinta.

O que certamente responde à pergunta lá de cima.

PS: os links citados neste artigo podem ser encontrados na seção "Escritos" do Sítio do B. Piropo, em <www.bpiropo.com.br>.

B. Piropo