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B. Piropo

< Coluna em Fórum PCs >
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07/02/2005

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Chegando aos 90 nm
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Todo o mundo conhece a “Lei de Moore”, pois não? Aquela que diz que a capacidade de processamento dos microprocessadores dobra a cada 18 meses e que vem sendo comprovada desde que Gordon Moore, um dos fundadores da Intel, a enunciou em 1965, quinze anos antes da era dos computadores pessoais. Na verdade, não se trata de uma lei científica como a da gravidade e similares. Ela é meramente o fruto da observação pessoal de Moore, que percebeu que o número de transistores dos circuitos integrados (um microprocessador nada mais é que um circuito integrado capaz de obedecer a instruções) crescia exponencialmente, dobrando a cada dois anos (naquela época; atualmente, a cada ano e meio), e previu que aquela tendência deveria continuar. Tratando-se de mera observação empírica, é espantoso como ela vem de fato se confirmando até os dias de hoje, como mostra a Figura 1, obtida no sítio da Intel (em < www.intel.com/research/silicon/mooreslaw.htm >, com mais informações sobre a lei e seu autor). Mas será que ela continuará valendo indefinidamente? Mantida a tecnologia atual de fabricação de microprocessadores, seguramente não. As previsões mais otimistas dão conta que ela vigerá ainda por cerca de quinze anos e o limite será atingido por volta do ano 2020.

(figura 1)

Nessa série de colunas vamos procurar entender a razão dessa limitação e discutir se ela poderá ser ou não contornada com o uso de uma tecnologia alternativa à usada hoje para a fabricação de microprocessadores.

Um microprocessador nada mais é que uma extremamente complexa combinação de elementos muito simples, as “portas lógicas”, circuitos elementares capazes de “tomar decisões”. E portas lógicas são materializadas através da combinação de transistores. Portanto, para aumentar a capacidade de processamento, como a Figura 1 ilustra muito bem, é necessário aumentar o número de transistores dos microprocessadores (além de aumentar sua freqüência de operação, naturalmente).

Acontece que transistores nada mais são que uma espécie de interruptor comandado eletronicamente (na verdade são mais que isso: podem atuar também, entre outras funções, como amplificadores de sinal; mas seu papel na informática praticamente se limita ao de “chaveador de corrente”, uma espécie de interruptor sofisticado). Ocorre que quanto maior for o número de transistores, maior será a potência consumida pelo microprocessador. E quanto maior a potência consumida, maior a energia dissipada sob a forma de calor. Trocando em miúdos: como qualquer micreiro de respeito está cansado de saber, quanto maior a capacidade de processamento de uma CPU, mais ela esquenta. E esquenta tanto que, se providências radicais não forem tomadas para reduzir a produção de calor e dissipá-lo mais eficientemente para a atmosfera, o circuito simplesmente derrete.

Ocorre que, como sabe todo estudante de física elementar, a potência consumida em um circuito reativo é inversamente proporcional à resistência à passagem da corrente elétrica e diretamente proporcional ao quadrado da tensão (ou seja: P=(V*V)/R). Achou complicado? Então esqueça. Lembre apenas que quanto mais aumenta o número de transistores (e sua freqüência de operação, outro fator importante para aumentar a produção de calor), mais aumenta o afã dos fabricantes de microprocessadores para alcançar dois objetivos, ambos voltados para a redução da dissipação de calor: diminuir a tensão de alimentação (ou “voltagem”) e reduzir a resistência. E ainda assim só obtêm um sucesso parcial: os primeiros microprocessadores não precisavam de qualquer dispositivo de dissipação de calor, simplesmente se encaixavam nos seus soquetes e liberavam o calor para o interior do gabinete pela face exposta. A partir do i386 começaram a ser usados dissipadores metálicos sobrepostos aos chips para aumentar a superfície de contato com o ar. Já os 486 passaram a usar pequenas ventoinhas sobre os dissipadores metálicos para acelerar a troca de calor. E os microprocessadores modernos usam gigantescos dissipadores metálicos dotados de potentes ventoinhas, e ainda assim esquentam como o inferno – não é à toa que o artigo de Mestre Paulo Couto de 4 de dezembro de 2004 neste   Forum PCs sobre refrigeração líquida de microprocessadores fez tanto sucesso.

Mas enfim: para continuar aumentando a capacidade de processamento de seus microprocessadores sem que eles derretam, os fabricantes devem ou baixar sua tensão de alimentação ou reduzir sua resistência à passagem da corrente elétrica ou ambos.

No que toca à redução de tensão, não poderão ir muito além do ponto a que chegaram: enquanto os primeiros microprocessadores eram alimentados com uma tensão de 5V, os modernos Pentium M, funcionando no modo “Battery Optimized”, de baixo consumo, trabalham com tensões de 0,812V operando na freqüência de 1 GHz (veja necessidades de tensão dos novos Pentium M em
< www.intel.com/support/processors/mobile/pm/sb/cs-007983.htm >). E dificilmente conseguirão descer abaixo desse limiar (na verdade os microprocessadores “normais” da Intel usam tensões de alimentação na faixa de 1,3V a 1,5V, sendo a do Pentium M mais baixa porque ele se destina a dispositivos móveis, ou seja, computadores portáteis alimentados por baterias). Em resumo: reduzir mais a tensão não dá.

Então, o único caminho que restou é reduzir a resistência elétrica.

Ora, os microprocessadores modernos contêm dezenas de milhões de transistores (os novos Itanium, centenas de milhões). E é preciso um bocado de tecnologia para encaixar um número tão grande de transistores em uma superfície do tamanho da unha de seu polegar (sim, esse é o verdadeiro tamanho de um microprocessador, aquele trambolho mais ou menos do tamanho de um biscoito creme cracker é apenas o encapsulamento, uma base para poder encaixar as centenas de pinos ou pontos de contato elétrico usados para se comunicar com o mundo exterior).

Um transistor, sabemos todos, é constituído de uma porção de silício à qual foram agregadas algumas impurezas, especialmente germânio. Então, para fabricar um transistor, basta pegar uma fina placa de cristal de silício puro e acrescentar pequenas porções do elemento germânio. E como um circuito integrado (logo, um microprocessador) nada mais é que uma combinação de um imenso número de transistores, para fabricá-los usa-se uma única camada de silício na qual se depositam microscópicas porções de germânio em determinados pontos. Depois, é só fazer as interligações elétricas e envolver o “chip” no encapsulamento (sim, eu sei, isso é uma explicação extraordinariamente simplificada, mas para o fim a que se destina é perfeitamente aceitável).

Disso tudo, nos interessa um aspecto: quanto mais fina a camada de silício usada como base do circuito integrado, menor a resistência que ela apresentará à passagem da corrente elétrica e, portanto, menor o calor dissipado. E, como o número de transistores e a freqüência de operação dos modernos microprocessadores continua crescendo, não podendo baixar mais a tensão de alimentação, só restou aos fabricantes continuar reduzindo a espessura da camada de silício.

Os primeiros microprocessadores usados em computadores pessoais no final dos anos setenta do século passado eram fabricados sobre uma camada de silício com espessura de 10 micra (“micra” é o plural de mícron, uma medida de comprimento que corresponde a um milionésimo do metro, ou um milésimo de milímetro). Dez anos depois, na era dos i486 atingiu-se a um décimo dessa espessura, ou seja, cerca de um mícron. E em mais quinze anos reduziu-se novamente em dez vezes essa espessura. Na verdade um pouco mais que isso: os microprocessadores atuais da Intel são fabricados sobre uma camada de silício de exatamente 0,09 micron (o mesmo que 90 nm, ou nanômetros, sendo um nanômetro uma medida de comprimento igual a um bilionésimo de metro, ou um milionésimo de milímetro ou ainda um milésimo de mícron).

Resumindo: os microprocessadores atuais são fabricados sobre uma camada de silício de 90nm de espessura e os fabricantes, na sua ânsia de reduzir a resistência para diminuir a dissipação de calor, pretendem reduzi-la ainda mais.

Mas o que significa realmente uma espessura de 90nm? Ela é muito pequena, sem dúvida. Mas é comparável a que?

Neste ponto, para que possamos realmente entender as limitações que discutiremos adiante, vamos fazer uma pausa para discutir tamanhos de coisas muito pequenas. Por exemplo: qual será a espessura de um fio de cabelo? E o tamanho de um grão de poeira, desses que não vemos mas sabemos que flutuam no ar que respiramos? Qual o tamanho de uma bactéria? E de uma molécula? Qual será o diâmetro de um átomo? Será maior ou menor que, por exemplo, o comprimento de onda da luz visível? E, se for menor, será que podemos vê-los, mesmo usando dispositivos óticos potentes como os microscópios de última geração? Sendo a fotografia nada mais que a captura e gravação da luz refletida por um objeto, será possível fotografar um objeto menor que o comprimento de onda da luz visível?

Intrigantes questões, pois não? Então, vamos a elas.

Ou melhor: vamos deixá-las para a próxima semana, senão não sobra assunto para a coluna.

B. Piropo