Sítio do Piropo

B. Piropo

< Trilha Zero >
Volte de onde veio
10/04/2000

< Torça por nós, usuários >


Segunda-feira passada o juiz Thomas Penfield Jackson concluiu que a Microsoft usou práticas anticompetitivas para assegurar sua supremacia no mercado, ferindo a legislação antimonopólio americana. Esta decisão é apenas o início de uma difícil batalha judicial que provavelmente se arrastará por anos a fio, pois Bill Gates imediatamente retrucou que esgotará todas as possibilidades de recurso. Mas suas conseqüências se fizeram sentir imediatamente: as ações da MS caíram 14% de um dia para outro e, ao final da jornada, computavam uma queda patrimonial de 97 bilhões de dólares, equivalente ao PIB do Chile.

O assunto certamente provocará exaltadas discussões. Na verdade, a MS tem tal poder de acirrar paixões que o difícil será justamente discutir o tema com isenção: em janeiro o editor da PC Computing, Paul Somerson, escreveu um artigo tão veemente em defesa da MS usando termos de tal forma virulentos contra o pessoal do Departamento de Justiça americano que levou um leitor a indagar (nas cartas dos leitores da mesma PC Computing de abril) se a motivação do autor teria sido "intelectual, emocional ou econômica". O tom do artigo foi tão exacerbado que fez a dúvida parecer cabível, deixando mal o editor de uma das mais respeitáveis revistas do grupo Ziff-Davis.

No que me diz respeito, já há algum tempo eu havia me convencido que, se o julgamento fosse isento, a decisão não poderia ser outra. Se dúvidas eu tivesse sobre a forma pela qual a MS manipulava o mercado, elas teriam se desvanecido na Comdex Spring de 1995, em Chicago, quando todas (enfatizo: todas) as principais softhouses americanas exibiam versões beta de seus programas para Windows 95, ainda não lançado, ignorando solenemente o OS/2 da IBM, um sistema operacional maduro e estável, já então há mais de dois anos no mercado e com alguns milhões de cópias vendidas. Considerando que se tratava de empresas comerciais cujo objetivo é ganhar dinheiro e levando em conta que a migração do código de um sistema para outro não é façanha de assustar um bom programador, era no mínimo estranho que tantas equipes de programação se dedicassem integralmente ao desenvolvimento de aplicativos para um sistema inexistente enquanto fechavam os olhos para outro, disponível. E quanto ao monopólio, francamente, não creio que ainda exista alguém suficientemente ingênuo para duvidar que com Windows a MS detém o monopólio de fato dos sistemas operacionais para o PC e se encaminha a passos largos para igual domínio no mercado de aplicativos com o Office. Portanto, em um quadro assim e face à decisão do juiz Jackson, é fácil converter a MS na vilã da história e trata-la como o império do mal.

Pois é bom pensar duas vezes.

A MS efetivamente detém o monopólio do mercado, não costuma tratar a concorrência com luvas de pelica e algo tem que ser feito para coibir essas práticas porque elas são ruins para nós, usuários. Mas é bom não esquecer que foi a MS e seu Windows (me refiro ao Windows 3, de dez anos atrás) que fez do PC uma máquina "que qualquer um pode usar" (e se você não entende o que quero dizer com isso, certamente nunca chegou perto de uma interface de caracteres usando linha de comando) e convém lembrar que foi a padronização promovida pela MS que lhe permite imprimir um arquivo de um programa que você acabou de carregar pela primeira vez e ainda não conhece, simplesmente acionando a entrada "Imprimir" do menu "Arquivo" sem se preocupar em carregar o driver de impressão do programa (sim, na era pré-Windows as entradas de menu ficavam onde melhor aprouvesse ao programador de cada programa e para imprimir alguma coisa era preciso que o programa se comunicasse diretamente com a impressora através de seu próprio driver). E tudo isso é muito bom para nós, usuários.

Durante todos esses anos este vosso criado já cansou de esculhambar e de elogiar a MS quando achou que ela merecia uma coisa ou outra. Considerando que no cômputo final o número de elogios foi significativamente menor que o de esculhambações, sinto-me muito à vontade para afirmar que, nessa briga que está apenas começando, seja qual for o grau de simpatia ou antipatia que a MS lhe desperte, convém tomar cuidado para não torcer contra ou a favor dela. Se é para torcer, torça por nós mesmos, desejando que o resultado não seja necessariamente aquele que mais vier a prejudicar ou beneficiar a MS. Mas sim o que for melhor para nós, os usuários.

B. Piropo