Sítio do Piropo

B. Piropo

< Trilha Zero >
Volte de onde veio
06/09/2004

< Nano >


O Vale do Silício se estende ao sul de San Francisco, cortado por um emaranhado de vias expressas cercadas por monolitos de concreto e vidro coroados com os nomes dos maiores gigantes da informática em néon multicolorido. Um paraíso raitéque.
Atravesse-o, e o panorama só muda depois de San Jose, rumo sul pelo antigo Camiño Real, hoje US 101. Os prédios se rarefazem, o casario é menos modernoso. Saindo do Camiño Real pela Bernal Road você perceberá um jeitão de interior. Quando notar um curral junto a um descampado, achará que, enfim, reencontrou a natureza. Logo adiante atravessará um pórtico e penetrará em uma reserva natural sem nada além da mirrada vegetação da região e um ou outro animal arisco escondido entre as moitas ralas. Acreditará que o mundo da tecnologia ficou para trás.
Isso, naturalmente, se não reparar, ao lado do pórtico, em um discreto logotipo de apenas três letras: IBM. Sinal que você está se aproximando de um dos mais avançados centros de alta tecnologia do planeta, o IBM Almaden Research Center, no topo da colina que coroa a reserva natural. Sete prédios interligados onde a segurança é tanta que as únicas portas que se abrem sem exigir identificação eletrônica são – graças a Deus – as dos banheiros.
Se um dia lá entrar, percorra aqueles corredores com o devido respeito. Ali foram concebidos os bancos de dados relacionais e a linguagem FORTRAN, desenvolvida a tecnologia de reconhecimento de voz, inventado o disco rígido e projetado o Deep Blue, o computador que derrotou Kasparov. Hoje, o objetivo das preocupações das mentes mais brilhantes deste santuário do conhecimento é a nanotecnologia.
“Nano” é um prefixo grego. Significa “de excessiva pequenez”. Você conhece pelo menos dois vocábulos dele derivados: “anão” e “nanico”. Foi adotado para identificar o submúltiplo correspondente a um bilionésimo da unidade (por exemplo: um nanômetro, ou nm, é igual a um bilionésimo do metro, ou um milionésimo do milímetro). Em suma: “nano” se refere a algo pequenininho pracacete, a beça ou mais. E “nanotecnologia” é o ramo da tecnologia que busca o controle da matéria na escala em que suas propriedades básicas são determinadas, portanto na escala molecular. Ou seja: que lida individualmente com as moléculas e seus átomos.
Mas por que uma empresa grande como a IBM há de se interessar por um treco pequeno como esse? Bem, razões não faltam. Por exemplo: lembra da “Lei de Moore”, que preconiza que a capacidade de processamento dos microprocessadores dobra a cada dezoito meses? Ela vem se confirmando há três décadas, mas não deverá se estender por outras tantas. Isso porque um dos fatores fundamentais para aumentar a capacidade de processamento é reduzir a espessura da camada de silício onde são moldados os transistores de que são feitos os microprocessadores. Atualmente essa espessura anda pela faixa dos 90 nm e continua se reduzindo. Há, porém, um limite intransponível: o tamanho da molécula do silício (não se pode construir uma camada cuja espessura seja “meia molécula” de alguma coisa). E não estamos muito longe disso.
Solução? Buscar outros meios de representar e armazenar bits. Meus alunos sabem que qualquer coisa que possa assumir dois estados mutuamente exclusivos, que possa alternar entre eles pelo menos uma vez e que permita determinar seu estado em um dado momento pode servir para isso.
Elétrons giram em torno de seu eixo (esse movimento chama-se “spin”). Então, um elétron girando em um sentido pode representar o bit “zero” e, no sentido oposto, o bit “um”. Para usar essa propriedade para armazenar bits basta ter acesso a elétrons individualmente, determinar seu sentido de rotação e mudar esse sentido quando desejado. Qualquer pessoa que tenha a noção do tamanho e das propriedades de um elétron provavelmente achará isso impossível.
Pois bem: em Almaden a IBM já conseguiu montar estruturas de átomos em posições determinadas (vá até <www.bpiropo.com.br e veja>, junto a esta coluna, algumas fotos extraordinárias), determinar o sentido de rotação de elétrons usando microscopia de ressonância de força magnética e alterá-lo usando uma tecnologia denominada “Junção de Túnel Magnético”. Tudo isso ainda em escala de laboratório. Mas estão trabalhando para chegar à escala industrial.
Calma: esta não é a primeira de uma série de colunas sobre esse espinhoso tema. Minha intenção é tão somente apontar o rumo das pesquisas de alta tecnologia e suas imensas potencialidades. Mas se você se interessa pelos detalhes, sempre pode visitar o IBM Research Center. Fica logo ali em <http://researchweb.watson.ibm.com/about/arc.shtml>. Boa viagem.

Arranjo de átomos de cobalto dispostos ao longo de uma elipse sobre uma superfície de cobre, com um átomo adicional de cobalto em um dos focos. Notar, á direita, no gráfico do campo gerado por esta disposição espacial, como a deformação do campo no ponto correspondente ao foco que contém o átomo adicional se "projeta", com menor intensidade, no ponto correspondente ao outro foco.

Sigla "IBM" formada com átomos "arrumados" em um plano.

Arranjos de átomos (de ferro sobre uma superfície de cobre) em disposição elipsóide e circular (com átomos adicionais no centro e no exterior do círculo).

 

B. Piropo