Escritos
B. Piropo
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11/07/94

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Como acho que a maioria de vocês já sabe, minha vida profissional nada tem a ver com informática. Sou engenheiro. E pouco antes de começar esta coluna terminei, afinal, um trabalho razoavelmente complicado, cheio de gráficos e tabelas que resumiam algumas centenas de dados. A cópia recém impressa a laser ainda fumega sobre a mesa. Enquanto juntava as páginas, olhei para o resultado e não pude deixar de sentir a reconfortante satisfação de haver concluído um trabalho bem feito. E muito bem apresentado.

O trabalho será submetido a um congresso especializado, avaliando o desempenho de um determinado tipo de equipamento. Durante meses o equipamento foi operado em condições controladas, cujas características eram anotadas, e feitas centenas de análises de laboratório. Depois, comparar e analisar os resultados, consideradas as diferentes condições. Não foi meu primeiro trabalho do gênero. Do primeiro, aliás, a gente nunca esquece: foi feito há mais de vinte anos. O assunto era outro, mas a técnica é sempre a mesma: juntar dados de campo coletados durante meses, compilá-los e analisá-los para extrair uma conclusão. Foi feito em parceria com um colega, meu amigo Gerson. Coletados os dados, foi preciso ordená-los em dezenas de tabelas preenchidas a mão, calcular médias e desvios, selecionar os parâmetros significativos, calcular os resultados parciais, analisá-los, chegar às devidas conclusões, rascunhar o texto, mandar datilografar, rever o material datilografado, corrigir os erros, mandar datilografar de novo, rascunhar os gráficos, mandar desenhá-los, corrigir, redesenhá-los, e assim por diante. No final, depois de mais de dois meses de muito trabalho braçal, mandar imprimir um monte de originais datilografados e desenhos a nanquim. Em todo o processo, uma única ajuda eletrônica: uma calculadora programável que tirava as médias e fazia uma pífia análise estatística dos dados brutos.

E este último, como foi feito? Bem, o processo de coleta de dados não pode ser outro: tem que ser na força bruta, no campo, anotando dados, coletando amostras, analisando-as em laboratório e anotando os resultados. Só foi diferente daí para a frente.

Também este foi feito em parceria, desta vez com a Tereza. Como sou mais velho, tinha que auferir disso alguma vantagem - já que as desvantagens são tantas: coube a ela digitar a montanha de dados brutos. Usou a planilha do MS Works, um programa integrado simplezinho mas perfeitamente adequado ao que dele se pretendia na ocasião. Quando começamos, afinal, a fase de análise dos dados, ao invés das centenas de folhas anotadas a mão tínhamos um único disquete. Um mísero disquete de 360K.

Daí para adiante, foi sentar em frente ao micro e mandar ver. Primeiro, importar os dados do Works para o Excel, uma planilha soberba. Tão boa que até recentemente fazia parte dos meus planos escrever um livro sobre ela - projeto infelizmente abandonado por absoluta falta de tempo. Os dados entraram suavemente, sem um único erro. Depois, formatá-los: alargar uma coluna aqui, estreitar outra ali, esconder mais uma acolá, mudar as fontes e tamanho das células, encaixar bordas e salpicar alguns negritos e itálicos para realçar. Finalmente, entrar com as fórmulas que transformaram os dados brutos nos parâmetros utilizados na análise, tirar as médias, calcular os valores máximos e mínimos, desvios e coisas que tais. Tudo isso, evidentemente, feito pelo próprio Excel, que a velha máquina de calcular programável hoje enfeita minha estante, repousando orgulhosamente ao lado da régua de cálculos. Tempo: menos de dois dias, dos quais, diga-se de passagem, gastamos a maior parte formatando a planilha só para ficar mais bonitinha.

Depois, analisar os dados e determinar os parâmetros que exercem maior influência no desempenho do equipamento. Aqui o micro não pode fazer muito: meus trinta anos de experiência profissional, algum tirocínio e o agudo senso crítico da Tereza ajudaram mais. Porém, mesmo assim, comparar resultados clicando aqui e ali para exibi-los na tela e subdividir janelas para vê-los simultaneamente sempre é mais fácil que manusear dezenas de folhas de papel que desenvolvem a estranha mania de se esconder sob pilhas de outras sem importância justamente quando a gente mais precisa delas. Tempo: um dia.

Separado o joio do trigo e extraídas as conclusões, há que apresentá-las. Primeiro, os gráficos e tabelas: marcam-se as colunas que interessam e manda-se o Excel fazer o trabalho braçal. Um dia inteiro. Mas não por culpa do Excel: três quartos dele foram gastos para melhorar a apresentação. Fontes, bordas, estilos de linha, tipos de gráfico (os em 3D, tão bonitinhos, exercem uma atração quase irresistível, mas os de barra são tão mais elucidativos...), tamanho, distribuição na página. Frescuras, enfim. Mas o resultado final ficou uma beleza.

Pronto. Agora a parte mais fácil: escrever. No Word for Windows, meu editor preferido para trabalhos impressos. Cinco páginas de texto, naquele estilo duro de trabalho técnico, com resumo, introdução, materiais e métodos, resultados, discussão e conclusões. O mais difícil foi me policiar para escrever tudo isso sem uma única pitada de humor, que o congresso é sério. No mais, o mesmo de sempre, portanto sem grandes novidades: escreve-se, revisa-se, muda-se, troca-se a ordem de alguns parágrafos (tente isso em uma máquina de escrever...), revisa-se novamente, pede-se para o próprio editor fazer a correção ortográfica, e voilá: agora é só formatar e imprimir. Escolhe-se as fontes mais bonitinhas, ajusta-se o tamanho do texto na página conforme o exigido, encaixa-se gráficos e tabelas nas devidas posições e presto!

Tudo pronto? Quase: a instituição que patrocina o congresso exige que os originais sejam apresentados também em disquete. Sinal dos tempos! E padronizou no formato de arquivo do Word Perfect. Mas não vai ser preciso digitar tudo de novo: basta mandar o Word salvar o arquivo no formato exigido. Tempo total gasto para gerar o produto final: cinco dias úteis. Uma única semana de trabalho.

Comparando com o primeiro, uma economia de sete semanas inteiras. E de muito trabalho braçal - sem contar as discussões com o datilógrafo e com o desenhista para fazer a coisa ficar exatamente do jeito que se quer. Graças ao micro, ao Excel, ao Word for Windows e ao OS/2, que gerenciou tudo isso.

Agora, cumprida a obrigação, vamos ao prazer: escrever a Trilha Zero. No micro, naturalmente. Por onde começar? Ah, lembrei:

Como acho que a maioria de vocês já sabe, minha vida profissional nada tem a ver com informática...

B. Piropo