Escritos
B. Piropo
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01/06/1998

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Dia destes recebi uma mensagem de, um leitor que, confiando na promessa do plug-and-play de resolver eventuais conflitos entre dispositivos, enfrentava o desafio de instalar seu primeiro modem interno. Ele espetou o brinquedo novo em um slot vazio, ligou a máquina e apreciou o processo de instalação que terminou com o bichinho aninhado na terceira porta serial, a COM3. O que seria perfeitamente natural exceto pelo fato de apenas a primeira, a COM1, estar em uso (no caso, ocupada pelo mouse). A segunda, a COM2, estava absolutamente livre e desimpedida. Por que cargas d'água o modem a rejeitou? E como fazê-lo migrar para lá?

Para quem tem alguma experiência no assunto, a questão é tão elementar que a resposta é instintiva: basta acessar o setup do micro durante a inicialização da máquina e desabilitar a COM2. Uma coisa evidente, pensei eu.

Na verdade, ela nada tem de evidente. Tanto assim que recebi de volta uma cortês mensagem do Adolfo. Primeiro, agradecendo, já que realmente o problema resolveu-se ao desabilitar a COM2. Depois, comunicando sua perplexidade com a solução, uma aparente agressão á lógica. Que pérfidas razões levariam a resolver o problema desabilitando exatamente a porta a ser utilizada pelo modem? E, tendo sido desabilitada, como pôde o modem usá-la?

A perplexidade é justa. Sua causa é o péssimo hábito dos técnicos de tratar com profunda displicência uma questão fundamental: o uso apropriado da terminologia. Pois tudo seria bem mais fácil de entender se não usássemos o mesmo nome para designar coisas completamente diferentes. No caso, a expressão "porta serial".

Ora, considerando que o problema incomoda a muita gente e que sua elucidação ensejará uma interessantíssima discussão, vamos a ele. Prepare-se então para uma fascinante excursão pelos meandros de seu computador. Se tiver paciência para acompanhá-la, prometo-lhe a maior das recompensas, o mais deslumbrante tesouro jamais alcançado pelo homem: o conhecimento. E asseguro que usarei uma linguagem tão simples e despida de tecnicismos que estará ao alcance do mais leigo dos usuários. Então ponha-se a vontade e relaxe, que nossa caça ao tesouro começará pela resposta a uma questão crucial: o que é uma porta?

Para entender o conceito de "porta" há que se levar em conta que o computador tem uma visão do mundo profundamente egoísta. De seu ponto de vista, o cosmos divide-se em apenas duas regiões: a interna, constituída por ele mesmo, computador, e a externa, formada pelo restante do universo. E a região interna, ou seja, o "computador", é extremamente limitada: consiste apenas do microprocessador (unidade central de processamento, ou CPU), da memória e de seus circuitos auxiliares. O resto está do lado de fora.

Esta visão deriva da conceituação da única tarefa que o computador sabe executar, magistralmente definida pela expressão "processamento de dados": os dados, originados no mundo exterior, são introduzidos na CPU e por ela processados, ou seja, transformados conforme o desejo do usuário. Os resultados intermediários permanecem no mundo interior, armazenados na memória. Mas o resultado final é sempre devolvido ao mundo exterior. Se você pensar um pouco, verá que esta singela descrição encaixa em qualquer das maravilhas realizadas por seu computador: dados de um CD de áudio são introduzidos no computador, processados e devolvidos ao mundo exterior sob a forma de maviosos acordes ecoados pelos alto-falantes, dados laboriosamente introduzidos pelo teclado são processados e transformados em uma sublime carta de amor devolvida ao mundo exterior pela impressora, dados capturados por um escaner são processados e entregues ao mundo exterior como uma linda figura exibida no monitor... Eu poderia citar exemplos indefinidamente. Todos, em sua expressão mais simples, descritos sempre da mesma forma: dados brutos entram no computador, são processados e saem.

E como os dados entram e saem? Fácil: através dos dispositivos de entrada e saída. Há vários. Alguns somente de entrada, que apenas levam os dados para o microprocessador, como teclado, mouse e escaner. Outros somente de saída, que unicamente transportam dados para o mundo exterior, como monitor e alto-falante. E outros ainda que funcionam tanto como dispositivos de entrada quanto de saída, como o modem (e, dentre estes, alguns dispositivos especiais, denominados "de armazenamento", como fitas magnéticas e discos rígidos ou flexíveis, que além de trocar dados com a CPU e memória, armazena-os para futura utilização). Na verdade, todo o universo dos computadores consiste apenas destes poucos elementos: microprocessador, memória, dispositivos de entrada, de saída e de armazenamento. E sua única função é processar dados trocados com o mundo exterior.

Pois bem: "portas" são um dos meios usados pelos dispositivos de entrada e saída para intercambiar dados com o microprocessador. Como qualquer outra, estas portas servem para um único fim: entrar e sair.

B. Piropo