Escritos
B. Piropo
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09/11/1998

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Hoje, eu pretendia escrever sobre uma determinada página da Internet. Tento conectá-la há meia hora e recebo sinal de ocupado de quatro números distintos em dois diferentes provedores. São, literalmente, centenas de linhas. Será que todas estão sendo usadas? Para me certificar, liguei para o celular do sysop de um dos provedores. Não, nenhuma linha ocupada, assegurou-me ele. O problema é que uma central da Telerj entrou em colapso. E como se trata de um nó importante do sistema, as comunicações de um lado da cidade com o outro ficaram bloqueadas. Por isso não posso acessar a Internet.

Então tá bom. Já que a Telerj não me deixa falar do que eu queria, vamos escolher outro tema. Que tal a própria Telerj? Afinal, foi ela que me roubou o outro assunto...

Um de meus provedores usa dois números telefônicos. Nestes tempos em que se pode acessar tantas linhas serializadas quantas se queira através de um único número, por que forçar os usuários a memorizar dois? Bem, é que há uma incompatibilidade entre algumas centrais antigas da Telerj e as linhas que usam a tecnologia digitronco. O resultado disso é que os usuários das regiões servidas por certas centrais convencionais não conseguiam se comunicar com o provedor. Como provedor algum pode se dar ao luxo de perder usuários, a solução foi usar dois números: um com algumas dezenas de linhas serializadas ligadas a uma central de tecnologia digitronco, outro com outras tantas linhas ligadas a uma central convencional. Problema resolvido? Esse, sim. A questão é que a solução criou outro: quando uma das linhas da central convencional apresenta um defeito, o sinal recebido por quem tentou ligar é o de "não atende". O usuário, naturalmente, desiste, deixando a linha com defeito no primeiro lugar da "fila" das linhas serializadas. Como enquanto ele não for ocupada todas as ligações caem nela, o resultado é o bloqueio das outras linhas. O leitor há de pensar que como isso somente ocorre quando uma linha está com defeito, o bloqueio deve ocorrer raramente. Engano: há meses que nunca deixou de haver pelo menos uma linha defeituosa. Neste exato momento (liguei para indagar) das 16 linhas convencionais, quatro estão com defeito. E basta uma para bloquear o acesso a todas a demais.

Se a Telerj faz isso com um provedor, cujo negócio depende do telefone, imaginem o que não faz com o usuário comum. Se você vive no Rio e usa os serviços da Telerj, sabe que recebe o pior serviço público jamais oferecido a uma comunidade (conheço países do chamado terceiro mundo com um serviço telefônico sofrível, mas de causar inveja aos usuários da Telerj). Um serviço cuja qualidade me obriga a recorrer mais uma vez àquele surrado chavão para descrevê-lo: se um gato cheirar, enterra.

Algumas pessoas poderão alegar que é preciso ter paciência. Afinal, a Telerj está substituindo equipamentos ultrapassados por dispositivos que usam tecnologia de ponta e durante a transição os transtornos são inevitáveis. Apesar da irritação e contratempos causados pela péssima qualidade dos serviços, usando meu bom senso eu estaria inclinado a concordar. Não fosse por alguns detalhes.

Eu dependo do telefone para trabalhar. Por isso, ao me mudar, ao invés de pedir a transferência para o novo endereço como qualquer usuário de uma prestadora de serviços decente, decidi comprar um telefone da central que serve o bairro para onde me mudei. O antigo, transferi para a casa de minha namorada, então servida pela mesma central. Dos transtornos que isso me causou na época sabem todos os que lêem essa coluna há mais de três anos, mas as coisas acabaram se acomodando. Pois este ano foi a vez da namorada se mudar. Pedi a transferência do telefone para o novo endereço e fui informado que a instalação seria feita em duas semanas. E, absolutamente estarrecido, assisti a instalação ser feita exatamente em inacreditáveis duas semanas.

O fato assombroso ocorreu no final de março. Há mais de sete meses. Pois pasmem, espantem-se, estarreçam-se, assombrem-se, embasbaquem-se, estupefaçam-se: desde então a Telerj não consegue me cobrar esse telefone. Não entendeu? Pois explico: o telefone está lá, funcionando mal e mal, como de hábito, desde março. Mas, apesar de meus ingentes esforços, reiteradas solicitações, incontáveis telefonemas além de duas visitas pessoais às lojas de (des)atendimento da Telerj pedindo pelo amor de deus que me cobrem o telefone enquanto o montante não ficar grande demais para que possa pagá-lo, a Telerj não me enviou uma única conta desse telefone. Segundo as informações que recebo dos inúmeros funcionários a quem tenho implorado que aceitem o pagamento, "houve um problema com a implantação da cobrança, mas semana que vem está resolvido". Há seis meses.

A que se deve esse fenômeno? Por mais que eu dê tratos a bola, não consigo encontrar razão que não possa ser classificada como incompetência, incúria administrativa, descaso pelo cliente, desatenção, desmazelo, desleixo, negligência ou similar. Exceto, é claro, esculhambação pura e simples.

Mas, pensando bem, vamos reavaliar a situação: trata-se de uma empresa (privada, é bom lembrar) que teoricamente vive dos serviços que presta mas que não tem sequer competência para cobrá-los de quem está ávido para pagar, coisa que qualquer dono de botequim de subúrbio resolve com meia dúzia de anotações em uma caderneta ensebada. E eu aqui reclamando que ela não consegue fechar um link digital com o backbone da Embratel para estabelecer uma comunicação via satélite com o resto do mundo.

Francamente!

Eu sou um besta, mesmo...

B. Piropo