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B. Piropo

< Coluna em Fórum PCs >
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20/10/2008

< Discos de Estado Sólido (SSD) II: Semicondutores >


UMA EXPLICAÇÃO NECESSÁRIA

Esta coluna, assim como a seguinte, foram editadas e substituídas depois da postagem inicial. Isto ocorreu porque, no original da primeira delas, havia um erro conceitual que foi corrigido nas edições posteriores. Minha primeira atitude foi incluir a correção como adendo, deixando o trecho que continha a imprecisão destacado no original. Fiz isso para que não parecesse que eu tentava esconder o erro. No entanto, os comentários dos colegas de Fórum (que não foram removidos) me convenceram que seria mais razoável efetuar a substituição. O argumento mais convincente foi o fato de que, sendo o FPCs uma fonte de consulta técnica bastante solicitada, não seria conveniente manter no ar um texto com uma imprecisão. Grato pela compreensão.

B.Piropo

Breve mostraremos como a STEC e EMC resolveram – melhor dizendo, contornaram – o problema da limitação do número de escritas em memórias flash para fabricar seus discos de estado sólido (SSD). Mas não esperem grandes truques de prestidigitação. A solução, como na maioria dos problemas referentes à informática, será de uma simplicidade tão evidente que mais parecerá uma “pegadinha”.

Na verdade a pista está na própria definição da < http://www.snia.org/ > SNIA do que vem a ser um disco de estado sólido citada na coluna anterior e aqui repetida para facilitar a leitura: “Um drive de estado sólido (SSD) é um dispositivo de armazenamento em bloco baseado em semicondutores que se comporta como um drive de disco rígido (HDD) virtual e aparece para o dispositivo que o hospeda como se fora um drive de disco”.

O segredo está na expressão “baseado em semicondutores” (embora em nenhum momento mencione as memórias tipo flash; ou seja: discos de estado sólido podem usá-las, é verdade, mas seu uso não exclui o uso de outros dispositivos de memória “baseado em semicondutores” com veremos adiante).

Mas o que é um semicondutor? Afinal, se um SDD é, por definição, um dispositivo baseado em semicondutores, não se pode falar deles sem explicar o que é e como funciona um material semicondutor.

Um material semicondutor é um material sólido cuja condutividade elétrica se situa entre a de um material condutor, como um metal, e a de um material isolante, como a borracha. E que, mediante a adição de impurezas convenientemente escolhidas, pode fazer sua condutividade variar em uma faixa ampla entre estes dois limites. Os exemplos mais comuns de materiais semicondutores são o silício e o germânio, ambos elementos de valência quatro (ou seja, que mantém quatro elétrons orbitando em sua camada externa). O mais usado industrialmente é o silício em virtude de ser um material abundante na natureza (veja mais detalhes em < http://www.amperesautomation.hpg.ig.com.br/semi.html > “INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS MATERIAIS SEMICONDUTORES”).

Materiais semicondutores podem se apresentar sob a forma de uma estrutura cristalina. Quando assim se apresentam, os núcleos de seus átomos se distribuem regularmente no interior do cristal como mostrado na ilustração da esquerda da Figura 1, cada átomo se ligando a quatro outros átomos.

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Figura 1: estrutura cristalina de materiais semicondutores.

Cada núcleo de átomo de silício tem quatro elétrons em sua órbita externa e o número de elétrons na órbita externa necessário para tornar um átomo eletricamente estável é oito. Na estrutura cristalina do silício, mostrada na ilustração da esquerda da Figura 1, cada átomo compartilha um dos elétrons de um de seus vizinhos e, por sua vez, compartilha um de seus próprios elétrons com cada um deles (as ligações mostradas entre núcleos, portanto, são constituídas de dois elétrons, um de cada núcleo). Assim, todos os núcleos permanecem eletricamente estáveis (porque apresentam oito elétrons na camada mais externa). Este tipo de ligação atômica se denomina “covalência”. 

Pela criteriosa adição de impurezas pode-se produzir dois tipos de material semicondutor, o tipo P (de positivo) e o tipo N (de negativo).

Produz-se um semicondutor tipo N adicionando ao cristal de silício (ou germânio) certa quantidade de impurezas de material de valência cinco (como os elementos fósforo, arsênico ou antimônio, que têm cinco elétrons orbitando na camada externa do átomo) que se integra à malha do cristal. Como bastam quatro elétrons por núcleo para equilibrar eletricamente a estrutura cristalina (cada átomo do cristal se liga a quatro outros, e assim sucessivamente) o quinto elétron de cada átomo de impureza fica praticamente “solto” na malha do cristal, ou seja, não está fortemente ligado a qualquer dos átomos do cristal. Veja, na ilustração central da Figura 1, o que ocorre quando um átomo de fósforo, pentavalente, se integra à estrutura cristalina do silício.  Como bastam quatro dos cinco elétrons da camada externa do fósforo para equilibrar eletricamente a estrutura cristalina, o quinto elétron “sobra” e permanece livre na malha cristalina. Como são muitos os átomos de fósforo adicionados, o resultado é um cristal onde há grande quantidade de elétrons livres, que podem se movimentar facilmente no interior do cristal. O material assim formado também é conhecido por “doador” (donor) de elétrons, já que elétrons podem ser “arrancados” dele quase sem esforço (veja o tópico < http://en.wikipedia.org/wiki/N-type_semiconductor > “N-type semiconductor” da Wikipedia)

Já os materiais tipo P são produzidos adicionando-se como impureza átomos de elementos trivalentes (como alumínio e boro, que têm apenas três elétrons na órbita externa de seus átomos). Quando estes átomos se integram à malha do cristal, as ligações atômicas ficam irregulares, ou seja, para cada átomo de impureza adicionado fica “faltando” um elétron para equilibrar as quatro ligações entre os quatro átomos vizinhos. Veja o resultado na ilustração da direita da Figura 1. É como se, em algumas das ligações elétricas entre os átomos que formam o cristal, houvesse uma “lacuna” (hole) onde deveria haver um elétron. O material assim formado também é conhecido por “receptor” ou “aceitador” (acceptor) de elétrons já que, buscando o equilíbrio, tem grande tendência de receber elétrons do exterior do cristal para preencher as lacunas (veja o tópico < http://en.wikipedia.org/wiki/P-type_semiconductor > “P-type semiconductor” da Wikipedia).

Um exemplo clássico do uso de ambos os materiais em um dispositivo eletrônico é o diodo retificador de corrente, formado por uma única junção P-N, ou seja, pela justaposição de duas regiões, uma constituída por material semicondutor tipo P, outra por tipo N. A superfície onde os materiais se tocam chama-se “junção”. Veja um diodo na Figura 2.

Figura 2: diodo de junção P-N.

O que acontece quando ligamos um destes dispositivos aos terminais de uma bateria? Bem, depende de que terminal do diodo é ligado a que terminal da bateria. Veja a Figura 3.

Figura 3: Polarização de diodos.

Na ilustração superior da figura 3 ligamos o terminal positivo da bateria ao catodo, ou seja, ao trecho constituído do material tipo P, e o terminal negativo ao anodo, ou trecho constituído do material tipo N. Isto se chama “polarização direta”. As cargas positivas oriundas do terminal positivo da bateria repelem as lacunas (também positivas) do material tipo P, “empurrando-as” para as proximidades da junção do diodo. Por outro lado, os elétrons frouxamente ligados aos átomos do material tipo N também são, por sua vez, repelidos para perto desta mesma junção pelas cargas negativas do terminal negativo da bateria. O resultado disso é que, nas vizinhanças da junção, acumulam-se de um lado “lacunas”, ou cargas positivas (no lado direito da figura) e, do outro, elétrons, ou cargas negativas. Como estas cargas se atraem fortemente, é fácil para elas romper a frágil resistência da junção e saltar de um lado para outro, estabelecendo uma corrente elétrica. Neste caso o diodo se comporta como um condutor.

Já a ilustração inferior da figura exibe uma ligação em polarização reversa. Um raciocínio semelhante ao desenvolvido no parágrafo anterior mostra que a região da junção fica “vazia”, ou seja, nem há cargas negativas de um lado nem positivas do outro (pois ambas são atraídas pelos terminais da bateria para longe da junção). Neste caso não há corrente, já que o diodo oferece uma elevada resistência ao fluxo de elétrons, se comportando como um isolante.

Esta propriedade, ou seja, o fato de o diodo conduzir corrente elétrica apenas em um sentido, funcionando como material isolante para correntes que tendem a fluir no sentido oposto, é muito usada para “retificar” corrente alternada. Isto porque ao se conectar anodo e catodo a um circuito onde flui corrente alternada, somente “passam” pelo diodo os pulsos correspondentes à polarização direta. Os correspondentes à polarização inversa ficam retidos pela elevada resistência que o diodo oferece a eles.

Pronto. Agora que já sabemos o que é o material semicondutor e já vimos uma de suas utilizações práticas, podemos discutir os transistores, a base das células de memória flash (e dos CIs, microprocessadores, memórias estáticas e praticamente tudo o mais que tem a ver com a informática).

Na próxima coluna, naturalmente.

 

B. Piropo