Sítio do Piropo

B. Piropo

< Coluna em IT Web >
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05/03/2013

< O velho e o micro >


A Internet é mesmo uma cornucópia inesgotável de informações. Inda agora eu estava fazendo uma pesquisa para ilustrar uma coluna que pretendia escrever sobre um dado assunto e acabei me deparando com alguns dados tão curiosos que me levaram a mudar o tema da coluna.

Eu pesquisava tecnologias avançadas, aquelas que anunciam que "o futuro chegou". E assistia < http://www.youtube.com/watch?v=_COkLs2jN5c > um vídeo de Cali Lewis (de 2011) sobre o assunto. Ela mostrou alguns dispositivos interessantes, como um liquidificador sem fio, um espelho de banheiro com uma tela de TV engastada e coisas do gênero. Mas o que me impressionou foram os dispositivos voltados para idosos, mais especificamente aqueles que moram sós ou permanecem sozinhos em casa por longos períodos: uma balança que cada vez que é usada transmite, via "bluetooth", o peso do usuário para um computador que, se constatar alguma mudança brusca, avisa ao médico por correio eletrônico. Ou um vaso sanitário que registra as vezes em que é usado e se não for, digamos, acessado, por alguns dias, informa também por correio eletrônico ao médico ou a um parente próximo que o idoso pode estar sofrendo de constipação. Havia outros produtos, como um fornecedor de medicamentos: uma maquineta giratória com compartimentos que se abrem a intervalos que podem ser ajustados, pondo à disposição do idoso os remédios a serem tomados naquele momento, tocando um bipe para avisar que está na hora do remédio e, se constatar que depois de algum tempo a medicação não foi removida, avisa por correio eletrônico ao responsável. Ou ainda um sensor de pressão para ser colocado entre o colchão do idoso e o estrado da cama, dotado de um alarme que envia ao médico ou parente próximo uma mensagem de alerta caso até determinada hora o idoso não tenha se levantado. Tudo isto controlado por um computador que não é operado pelo idoso, mas pela pessoa responsável por ele.

Figura 1. Presto A10 Printer.

A reportagem é encerrada com a exibição da < http://www.presto.com/ > Presto A10 Printer, um dispositivo muito peculiar. O produto não é novo: foi lançado no final de 2006. Mas ainda está no mercado, onde pode ser encontrado pela módica quantia de US$ 99,99 mais um pagamento mensal de US$ 12,50 pelo serviço. Portanto, pode não ter sido um sucesso de vendas, mas deve vender o suficiente para garantir sua presença nas prateleiras.

Presto A10, como o nome indica, é uma impressora. Mas uma impressora peculiar. Ela não se conecta a um computador, como a maioria das impressora que conhecemos: se conecta diretamente à linha telefônica. Para que ela funcione é preciso abrir uma conta no serviço de correio eletrônico da Presto e receber um endereço tipo "[email protected]".

Estranhou que impressora tenha seu próprio endereço de correio eletrônico? Pois não estranhe. A única função da Presto é receber mensagens – que podem, inclusive, conter imagens – e imprimi-las. Mais nada.

Resumindo: Presto A10 é uma máquina de imprimir mensagens de correio eletrônico.

É claro que um negócio destes pode ser inundado de Spams e esgotar tinta e papel em algumas horas. Para evitar isto, a máquina só recebe mensagens de pessoas autorizadas. E não ocupa sua linha telefônica: ela se conecta aos servidores cinco vezes por dia, verifica se há mensagens, se houver as imprime e em seguida desconecta-se.

Para que serve um negócio destes?

Para que pessoas que não têm computador (em geral por não saber usá-lo) possam receber mensagens de correio eletrônico (infelizmente a maquineta não oferece meios de respondê-las, mas poder receber já é uma ajuda e tanto).

Até aqui está tudo muito bom, está tudo muito bem, exceto por um detalhe: segundo as análises, Presto foi concebida para velhos (as pessoas da terceira idade não se ofendam com o tratamento; afinal, a maioria delas que estão lendo estas mal traçadas é mais jovem que eu – ou menos velhos, como preferirem).

E isto não é invenção minha. Logo após o lançamento, no final de 2006, Blake Robinson publicou uma análise de produto intitulada < http://techcrunch.com/2006/12/14/presto-for-the-elderly/ > "Presto! For the Elderly" ("Presto! Para os idosos"). E Blake Robinson publicou o artigo < http://techcrunch.com/2006/11/27/presto-because-computers-scare-old-people/ > "Presto: Because Computers Scare Old People" ("Presto: porque computadores intimidam os velhos"). E no próprio vídeo de Cali Lewis citado no início, ao apresentar uma impressora Presto, ela informa que "52% dos idosos não têm acesso a computadores ou a Internet".

Seria isto implicância com os velhos?

Ou os velhos realmente teriam alguma ojeriza por computadores?

Bem, uma tentativa de esclarecer o assunto foi feita em um artigo intitulado < http://www.sciencedaily.com/releases/2007/03/070316140944.htm > "Why Computers Frustrate Older Adults" ("Porque os computadores frustram idosos"), cujos dados foram obtidos da Universidade de Alberta, Canadá, publicado na respeitabilíssima Science Daily em março de 2007.

Começando por ressaltar que mudanças sociais estão enfatizando a importância de tornar a tecnologia da Informação acessível aos idosos, que necessitam dela para manter contatos sociais via correio eletrônico e consultar a Internet para obter informações sobre saúde, o artigo segue relatando uma pesquisa que analisou o desempenho de quarenta idosos em um teste de uso de computadores e Internet. O objetivo era desenvolver um meio prático de transmitir conhecimentos de TI para idosos.

Algumas conclusões do estudo são óbvias, outras nem tanto.

Por exemplo: idosos confiam menos em seus conhecimentos sobre informática que jovens. E uma das razões para isto é que receiam que a redução da capacidade de memorizar possa afetar seu desempenho. O estudo conclui que esta falta de confiança é um dos principais fatores que afetam a capacidade de idosos se tornarem proficientes no uso de computadores.

Outra conclusão do estudo é que idosos precisam vencer obstáculos causados pela perda natural, com a idade, da acuidade de seus sentidos e habilidades que afetam, por exemplo, a visão, audição e a capacidade motora (principalmente os que sofrem de artrite e tremores, que dificultam bastante o uso do teclado e mause). Por isto o estudo recomenda que, ao instruir idosos no uso de computadores, se use fontes maiores, fale-se suficientemente alto e pausadamente para assegurar que as instruções sejam ouvidas e entendidas e que o instrutor sempre demonstre previamente como cada tarefa será executada para reduzir a ansiedade.

Tudo isto faz muito sentido.

Mas a meu ver o principal fator que dificulta o uso de computadores por idosos – e mesmo por um bom número de adultos menos jovens mas ainda não idosos – não foi percebido pelo estudo.

Seguinte: certamente todos vocês conhecem casos de crianças, por vezes com menos de dez anos, que ajudam os pais em dificuldades com seus computadores. E adolescentes, então, se os pais não forem do ramo, dão banho.

De onde vem esta facilidade que as crianças demonstram no uso do computador?

Bem, você já viu como uma criança de cinco anos ou pouco mais se comporta quando lhe entregam o controle de um computador? Elas agem como exploradores, trilhando caminhos desconhecidos, enveredando por desvão que os adultos mal percebem. Experimentam de tudo, clicam em toda parte, fuçam cada recurso e jamais se frustram quando o resultado não é o esperado. Se não der certo, tentam de novo, incansavelmente. E continuam mexendo onde podem até descobrirem coisas que um adulto não descobriria jamais simplesmente porque não ousaria fazer o que eles fazem

Por que?

Porque, ao contrário da criança, o adulto, ainda que não o perceba, tem medo de "quebrar alguma coisa". Um receio que o impede de experimentar, tentar, ousar. Em geral o adulto, principalmente o idoso, se restringe ao pouco que sabe e só trilha caminhos que sabe serem seguros.

O problema é que assim não acumulam novos conhecimentos. Quem se limita a fazer apenas o que já sabe, sem se aventurar no desconhecido, não evolui.

Então aqui vai meu conselho aos leitores, especialmente os idosos (ou os que lidam com idosos): se quer aprender, tente. Explore. Fuce. Mexa-se.

Não tenha receio. Nada se estragará. O máximo que você conseguirá é perder dados, mas geralmente as máquinas usadas para aprendizado não armazenam dados importantes.

Coragem. Tenha em mente o seguinte: a única forma de "estragar" alguma coisa no computador usando teclado e mause é agarrar o teclado com as duas mãos e desferir uma senhora pancada na tela.

Acredite.

Afinal, quem está escrevendo isto é um septuagenário que tinha os dedos virgens de teclado até ser quase cinquentão...



B. Piropo