Sítio do Piropo

B. Piropo

< Trilha Zero >
Volte de onde veio
16/05/2005

< Dois núcleos >


Nesses últimos tempos esta coluna tem evitado abordar temas técnicos e hoje não será exceção. Portanto, se você sentir um cheiro de tecnicismo, releve. O objetivo não é discutir a tecnologia, mas sim explicar uma recente mudança. Um assunto que, se os detalhes técnicos desagradáveis forem evitados, pode lhe interessar.

Provavelmente você já ouviu falar nos novos processadores de núcleo duplo (“dual core”) lançados no mês passado com grande estardalhaço pela Intel e por sua maior concorrente, a AMD. Qual teria sido a razão disso? Qual a vantagem de um processador de dois núcleos? Para entender, voltemos um pouco no tempo.

Uso computadores da linha PC há duas décadas. O primeiro era um XT com um processador que operava com uma freqüência pouco menor que 5 MHz. Processador, Unidade Central de Processamento (CPU) ou microprocessador, é o componente principal do computador, responsável pelo desempenho do micro. Que, naqueles tempos, era diretamente proporcional à freqüência de operação. 5 MHz significava que o processador executava cinco milhões de “ciclos de máquina” por segundo (um ciclo de máquina é o suficiente para o processador executar uma operação elementar como incrementar um número, mas operações mais complexas podem exigir muitos ciclos de máquina). Ora, fazer cinco milhões de qualquer coisa por segundo era um negócio impressionante. Mas não o suficiente para que os usuários ficassem satisfeitos com o desempenho. Eles queriam mais e a indústria os satisfez. Hoje, os processadores mais rápidos operam em cerca de 4 GHz, ou quatro bilhões de ciclos de máquina a cada segundo. Oitocentas vezes mais depressa que o velho XT.

O problema é que a exigência de maior desempenho jamais se atenuou. Na medida que os aplicativos e sistemas operacionais tornavam-se mais complexos e poderosos, aumentava a demanda por máquinas mais rápidas. E máquina mais rápida significava microprocessador com maior freqüência de operação fabricado com camada de silício (a matéria prima usada para fabricar transistores, os componentes eletrônicos de que são feitos os processadores) cada vez mais finas. A CPU do velho XT usava uma camada de silício de um centésimo de milímetro. As dos processadores modernos são mais de cem vezes mais finas.

Ocorre que, nesse ponto, o computador não é diferente de qualquer outra máquina: maior rapidez exige maior consumo de potência. E maior consumo de potência implica maior dissipação de energia. Que, nos microprocessadores, se dá sob a forma de calor. Logo, quanto mais rápidos os processadores, mais eles esquentam.

No começo, foi fácil. Os processadores de meus três primeiros micros, o XT, o AT e o “ 386”, pousavam livres e soberanos sobre a placa-mãe. Já seu sucessor, um “ 486”, exigiu sobre ele um “dissipador de calor”, uma peça de alumínio cheia de aletas cuja função era remover o calor gerado e dissipá-lo na atmosfera. E daí para a frente a coisa complicou. Surgiram as ventoinhas que forçavam a circulação de ar frio entre as aletas dos dissipadores. Que por sua vez foram ficando cada vez maiores. E as ventoinhas mais potentes. Hoje em dia há até quem use processadores refrigerados à água.

Mas tudo tem um limite. E, mantida a atual tecnologia de fabricação, tanto a dissipação de calor quanto a espessura da camada de silício estão muito próximas de seu limite. Resultado: ou se muda a tecnologia ou se consegue uma forma de aumentar o desempenho sem que isso implique o aumento da freqüência de operação.

Lembra do velho problema que perguntava: “se um homem constrói um muro em cinco dias, quantos dias levarão dois homens para construir o mesmo muro”? Pois a solução encontrada pela indústria de microprocessadores baseia-se na mesma idéia: dividir o processamento em tarefas executadas simultaneamente por dois processadores. Ou pelos dois núcleos de um mesmo processador. Com isso faz-se a mesma coisa (quase) duas vezes mais depressa. Ou (quase) duas vezes mais coisas no mesmo tempo. Em suma: troca-se o aumento da freqüência de operação do processador pelo aumento de seu número de núcleos. E ganha-se uma boa folga até conseguir uma alternativa (que está sendo ferozmente perseguida) para o processo de fabricação atual.

Portanto, acostume-se. Daqui para a frente você vai ouvir falar muito de processadores com dois núcleos. Ou quatro. Ou oito. Para ser franco, já ouvi falar até em 16 e 32.

É esperar para ver.

B. Piropo