Sítio do Piropo

B. Piropo

< Trilha Zero >
Volte de onde veio
19/09/2005

< Usando computador >


Para que serve o computador? Meus alunos responderão em uníssono: “processar dados”. Os leitores agregarão: editar textos, fazer cálculos, ouvir música, jogar e mais um mundo de coisas. Mas há serventias das quais pouco nos lembramos.

Semana passada visitei a exposição “Estado de Atividade Funcional” de Tina Velho no Centro Cultural da Telemar, na Rua Dois de Dezembro, Catete. Arte em estado puro. Tina é professora da Escola de Artes Visuais do Parque Laje. As peças expostas, todas geradas em computador, são videoinstalações. Versam sobre pulsação, fluxo, vida. Segundo Tina, “na pulsação habita a igualdade entre todos os seres vivos” . Veja uma amostra no sítio de Tina, aliás ele mesmo uma obra de arte, em < http://www.tinavelho.com.br/eaf/ >. Mas o que realmente vale é uma visita à exposição. Onde você constatará que computador também serve para fazer arte.

Dia seguinte, rumei para São Gonçalo para rever Mestre Bode, que conheci em um evento de informática há alguns meses. Fui à inauguração do “espaço multimídia” de sua ONG, a Magê-Malien, “crianças que brilham” em iorubá. E brilham mesmo. Principalmente porque refletem a luz de Mestre Bode.

Ele se diz Mestre de Capoeira, mas isso é pura modéstia. Seu mestrado vai além. Mestre Bode é Mestre de Vida. Há alguns anos, em um dos lixões da periferia do Rio, conheceu um grupo de crianças. Para elas o lixão era ambiente, meio de vida e moradia. Com uma roda de capoeira Mestre Bode as atraiu, conquistou sua confiança e respeito, ensinou-lhes capoeira, disciplina e, sobretudo, orgulho, amor próprio e cidadania. Batalhador, bateu às portas da prefeitura, cadastrou as famílias, descolou um conjunto habitacional abandonado e acabou alojando por lá sessenta famílias. Deixou um aluno cuidando da roda de capoeira e seguiu adiante, sempre nessa lida. Em suas rodas de capoeira e cidadania já “jogaram” mais de seiscentas crianças.

Mestre Bode e seus alunos

Todo Mestre tem discípulos. Como Milonga, uma empregada doméstica. De segunda à sexta, vive na casa da patroa, no Rio. Os fins de semana passa em casa, na Baixada. Uma de suas tarefas era levar a menina da casa em que trabalha à aula de capoeira, que é assim que Mestre Bode ganha a vida. Lá, interessou-se não apenas pela capoeira como pelo trabalho social. Juntou-se ao grupo, aprendeu capoeira, aperfeiçoou-se. Quando se achou preparada, armou sua roda de capoeira em plena rua e começou seu trabalho. O clube local ofereceu-lhe um espaço. Hoje, ainda empregada doméstica, dedica os finais de semana a ensinar auto-estima, disciplina e cidadania às crianças de sua comunidade. E capoeira, naturalmente. Na inauguração da sede da Magê-Malien tive a honra de conhecer Milonga e algumas de suas crianças. Acredite, é comovente olhar nos olhos de alguém que tem tão pouco nas mãos mas divide com tantas crianças o muito que guarda no coração.

A sede da Magê-Malien fica perto da casa de Mestre Bode. Foi um centro espírita, tornou-se um galpão abandonado ocupado por meliantes. Com um pouco de psicologia, alguma capoeira braba e muita moral, mestre Bode pô-los para cantar em outra freguesia. Ocupou o espaço. Batalhou e conseguiu apoio. Começou com a Arteccom, empresa de design digital, tecnologia e comunicação < www.arteccom.com.br/ > de sua aluna e capoeirista emérita Adriana. A ela juntaram-se a HostNet (< http://web.hostnet.com.br/ >), empresa que hospeda meu sítio, a WTG Sistemas & Marketing (< www.wtg.com.br/>) e a Nitideal (< www.nitideal.com.br/ >), estas duas de Niterói. Resultado: no galpão reformado abriu-se espaço para capoeira, um laboratório de informática e a Weberê, uma agência piloto de desenvolvimento de sítios da Internet. Tudo com material doado.

A idéia é usar a capoeira para atrair, disciplinar e cultivar a auto-estima da meninada enquanto ao lado elas aprendem a lidar com os computadores e treinam o desenvolvimento de sítios. A Hostnet, WTG e Nitideal, além do apoio financeiro, oferecem estágios para os que mais se destacarem.

Computador também serve para fazer cidadania.

A sede e a Weberê são o primeiro passo. Mas o projeto precisa de ajuda para crescer. Sobra vontade e entusiasmo, mas faltam máquinas, falta dinheiro, faltam recursos. Se você quiser saber mais sobre o projeto e ajudar, entre em contato com Adriana Melo, em < [email protected] >.

Voltei com a alma leve. Vocês não sabem como, nesses tempos severinos, faz bem lembrar que existe gente como Mestre Bode e Milonga. Ajuda a recuperar um pouco da fé já quase perdida na humanidade...

B. Piropo