Escritos
B. Piropo
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09/12/1991

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De quando em vez recebemos uma carta sobre Windows. Não muitas: o interesse é pequeno se comparado com o que ocorre nos EUA, por exemplo. Mas em número suficiente para justificar esta parada em nossa viagem pelos arquivos de configuração e revelar um universo desinformado e conflituoso. Desinformado por que a maioria desconhece completamente o que seja Windows. E conflituoso por que, dos que conhecem, as opiniões se dividem entre quem crê ser quase impossível viver daqui para a frente sem Windows e quem acha que é quase impossível viver com ele. E o curioso é que não há meio termo. E, mais curioso ainda, é que ambas as opiniões fazem sentido. Vamos ver porquê. Começando do princípio.

Muita gente pensa que Windows é um sistema operacional. Não é: Windows é uma GUI (Graphics User Interface, ou interface gráfica com o usuário). O sistema operacional que Windows usa para rodar continua sendo o bom e velho DOS. No mesmo? Eu explico.

O sistema operacional é um programão que toma conta da máquina enquanto os outros programas estão rodando (inclusive Windows) e fornece a eles alguns serviços básicos como gravar e ler arquivos em disco e exibir informações na tela. No PC o sistema operacional dominante é o DOS. Ao ligar a máquina ele assume o comando e aguarda as ordens do usuário. Para informá-lo disso, exibe na tela um sinal chamado "prompt", que deveria significar algo assim como "Amo e senhor, estou pronto para servi-lo". Você pode modificar o formato do prompt, mas na maioria das vezes ele exibe o disco e via de diretório correntes seguido de um sinal de "maior que". E a partir dai o usuário tem que se entender diretamente com o DOS, ou seja, tem que interagir com ele.

O sistema operacional consiste de uma série de trechos de código que permitem executar certas tarefas como copiar, renomear, apagar arquivos e diretórios e outras tantas funções elementares. Como ele foi concebido para prestar estes serviços diretamente aos programas e não ao usuário, é preciso um programa auxiliar para permitir que o usuário tenha acesso a estas tarefas, ou seja, que funcione como um intérprete entre usuário e sistema. Tradicionalmente este programa auxiliar é o Command.Com. Portanto, a interface com o usuário do DOS é o Command.Com. E a maneira do usuário se comunicar com o sistema é a linha de comando.

A linha de comando é exatamente o que o nome diz: uma linha a ser digitada em frente ao prompt, na qual o usuário emite um comando que será obedecido pelo sistema operacional. Desde que o sistema operacional o entenda, é claro. Mas acontece que o sistema operacional é muito exigente: um único caractere mal digitado e lá vem a irritante mensagem "Bad command or file name" (ou em português: "Comando ou arquivo inexistente"). Pois o DOS espera encontrar na linha de comando o nome de um comando (como "copy", "delete" ou "type") ou de um arquivo executável (como o que contém um programa). E pega o que foi digitado e compara primeiro com uma tabela interna com todos os nomes de comandos, depois com os nomes de arquivos executáveis no diretório corrente, e finalmente com os que estão nos diretórios contidos na variável ambiental PATH. E não achando nenhuma correspondência, lasca a mensagem na tela. E a correspondência tem que ser exata: um único caractere trocado, um espaço a mais e dançou...

Isto é ruim: o usuário é obrigado a conhecer um número enorme de comandos, saber como usá-los e digitá-los sem um único erro. Com nomes nem sempre fáceis: não somente são todos em inglês, como também por vezes o execrável limite de oito caracteres para nome de arquivos força a malabarismos inacreditáveis (eu nunca consigo digitar "chkdsk" sem enfiar uma vogal ali no meio). O que me faz pensar em uma nova leitura para o prompt: "Amo e senhor, estou pronto para servi-lo. Mas desde que você saiba pedir direitinho e obedeça às regras estritas e complicadas que eu estabeleci para você. Senão eu vou enchê-lo de mensagens curtinhas e assustadoras que não informam direito onde você errou e somente vão servir para deixá-lo nervoso e fazê-lo errar ainda mais. E não faça nenhuma besteira, senão eu penduro o sistema e mergulho nas entranhas de sua máquina, de onde você só vai me tirar com um reset. Agora, digite seu comando - se tiver coragem...".

Não é de se surpreender, então, que começassem a aparecer programas destinados a facilitar a vida do usuário, interpondo-se entre ele e a máquina, afastando-o das complicações do Command.Com, servindo portanto como uma nova interface entre o sistema operacional e o usuário. Estes programas receberam o nome genérico de "shell" (concha, em inglês), e se "fecham" em volta do DOS, substituindo os esotéricos comandos por maneiras mais fáceis de interagir com a máquina. Há muitos, desde o excelente XTree até os não menos bons PCShell, Norton Commander e o Click patrício. Todos usando uma tela em modo texto onde aparecem a árvore de diretórios e nomes de arquivos de um diretório escolhido, em geral com um destaque em vídeo reverso ou cores diferentes dos demais. Estas são interfaces com o usuário em modo texto. Você pode mover o destaque para um nome em particular (evitando ter que digitá-lo) e emitir comandos usando menus. O comando vai agir sobre o nome destacado, e temos conversado. Se quiser você pode até mesmo "chamar" outros programas sem sair da shell e nunca mais se defrontar com o prompt do sistema. Comparado com a linha de comando, uma maravilha. Eu mesmo raramente a utilizo para outra coisa que não carregar programas. E até mesmo o DOS, afinal, percebeu o óbvio: desde a versão 4 ele traz sua própria shell. Que não é nenhuma maravilha, mas já é um progresso.

Acontece que desde há muito os usuários de PC vinham espiando as telas do Mac. Aquela coisa cheia de figurinhas, aquele vai-vem de cursor do mouse, aquelas cores. Alguns com desdém: conheço uma moça que acha um insulto à inteligência do usuário aquela latinha de lixo para apagar arquivos. Outros com uma certa pontinha de inveja: aquele troço é meio bobo, mas não deixa de facilitar a vida, pensavam eles.

Vocês, que nunca viram uma tela de Mac, devem estar se coçando. Os que começaram a ler interessados em Windows, mais ainda, já que até agora não se falou dele. Mas acontece que as coisas estão interligadas. Tanto Windows quanto o MacIntosh usam a mesma filosofia para se entender com o usuário: desenhos (ou ícones) na tela em modo gráfico que representam ações. Que podem ser executadas por meio do teclado, mas foram na verdade concebidas para serem ativadas por um clique de mouse. Em suma: uma GUI, ou interface gráfica com o usuário.

Que vamos começar a destrinchar agora.

B. Piropo