Escritos
B. Piropo
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03/08/1992

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Já sabemos que motores de passo têm um inconveniente: seu próprio desgaste, inevitável, e eventuais deformações nos discos metálicos causadas pela dilatação ou contração por variações de temperatura, podem fazer com que as cabeças magnéticas se desloquem ligeiramente da posição sobre a qual as trilhas foram originalmente gravadas. E bastam deslocamentos micrométricos para que os dados não sejam encontrados.

Discos RLL apresentam ainda mais um ponto crítico: como os dados são comprimidos para serem gravados e descomprimidos ao serem lidos, sua validação é mais difícil. Os bits não fluem em uma cadência constante entre o drive e a placa controladora onde são codificados, dificultando a detecção de erro. Alie a isso a grande distância entre a superfície do disco e a placa, que os dados percorrem em longos cabos sujeitos à ruídos e interferências eletromagnéticas, e você tem um sistema muito pouco confiável.

Se a interface controladora estivesse mais próxima da superfície magnética, a probabilidade de que os dados se corrompessem no trajeto entre disco e interface seriam minimizadas. E se houvesse uma forma de mover a cabeça exatamente para a trilha orientada apenas por forças eletromagnéticas, as imprecisões dos motores de passo seriam evitadas. E todo o sistema seria mais seguro.

Pois então imagine um disco rígido no qual a interface controladora e o codificador/decodificador de dados (endec) ficassem presos à própria caixa do disco, e portanto muito mais perto da superfície magnética. Com isso se eliminam as interferências nos cabos. Ora, dirá você: a mágica parece um tanto besta, pois seja como for os dados devem ser transportados por um cabo entre a interface e a placa mãe. Sim, direi eu. Mas esse cabo transporta apenas dados não codificados, muito mais confiáveis. E passíveis de validação. Portanto a coisa funciona muito melhor.

Isso elimina apenas parte da imprecisão: o velho motor de passo continua lá. Mas espere: imagine que as cabeças possam se movimentar continuamente sobre a superfície do disco, sem "saltos" descontínuos de trilha a trilha. Para isso seria preciso um outro tipo de motor para movê-las, um que fosse acionado apenas por forças eletromagnéticas, sem "paradas" como o motor de passo.

Você já reparou em um alto-falante? A membrana vibra e produz som. Já se preocupou em saber o que a faz vibrar? No centro do alto-falante, presa à membrana, há uma peça dentro de um imã redondo. Em torno dela há um fio enrolado, mais conhecido por "bobina". Faça passar uma corrente elétrica pela bobina e parece que nada acontece. Agora, faça variar a intensidade dessa corrente: a bobina dá um salto dentro do imã. Pois acontece que a variação de uma corrente elétrica em uma bobina gera forças eletromagnéticas que são atraídas ou repelidas pelos pólos do imã, o que faz mover a bobina. E obriga a membrana a se mover com ela. É assim que os conjuntos de rock conseguem fazer tanto barulho: suas lamentavelmente potentes guitarras produzem variações de corrente elétrica que são amplificadas e enviadas para as bobinas dos alto-falantes. Essas variações produzem forças eletromagnéticas que são atraídas ou repelidas pelos imãs e fazem mover as bobinas presas à membrana. Que, ao vibrar, gera aquele barulho que eles chamam de música e estilhaça nossos tímpanos e nervos.

E o que tem isso com os HD? Ora, muita coisa. Pois imagine uma dessas bobinas ao serviço das forças do bem, presa ao eixo que move as cabeças de leitura/gravação de um disco rígido: variando a corrente elétrica nessa bobina pode-se fazer o eixo se deslocar continuamente dentro do imã, para frente e para trás, como a vara de um trombone. E as cabeças podem deslizar suavemente sobre a superfície magnética, sem "saltos". A esse tipo de motor chama-se "voice-coil" (bobina de voz), justamente porque deriva do sistema usado em alto-falantes.

Pronto: agora só falta um jeito de fazer as cabeças pararem exatamente sobre as trilhas. Mas isso não é tão difícil: basta dedicar uma face magnética de um dos discos exclusivamente para esse fim. Nessa face, ao invés de se gravar dados, gravam-se sinais magnéticos que indicam a posição da cabeça que desliza sobre ela. Como essa cabeça está ligada às demais, sempre que ela parar em uma posição, todas as outras estarão na posição correspondente. Agora ficou fácil: quer ler a trilha zero? A cabeça dedicada vai deslizando sobre a superfície magnética, "lendo" a posição onde se encontra e enviando a informação ao motor. Quando chega à trilha zero, ela "avisa" ao motor, que pára de se movimentar. Meu sonho: todas as cabeças agora estão sobre a trilha zero.

Deu-se a esse sistema o nome complicado de "mecanismo servo-controlado em loop fechado e superfície dedicada". Mas só o nome é complicado: o sistema em si mesmo é muito simples. E de uma extraordinária engenhosidade. Sendo o posicionamento das cabeças baseado exclusivamente em informações gravadas em uma das superfícies, independe de eventuais dilatações e contrações térmicas: como todas os discos metálicos sofrem as mesmas deformações, inclusive a superfície dedicada, as cabeças estarão sempre exatamente sobre as trilhas. E, por razões evidentes, não se altera com a posição do disco. E traz ainda mais uma vantagem: ao se desligar a máquina, as cabeças automaticamente se recolhem sempre para a mesma posição, evitando a necessidade de estacioná-las.

Gostou? Então vamos discutir o tipo de disco rígido que usa esse sistema.

B. Piropo