Escritos
B. Piropo
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14/09/1992

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Há quem diga que as máquinas mais poderosas são um exagero. Que, no fundo, tudo o que precisamos é do bom e velho XT. Que, aliás, com seu fiel escudeiro, o monitor de fósforo verde, está sobre a mesa de nove entre dez brasileiros. E reclama que a turma dos XT está cada vez mais deserdada. De fato, Windows 3.1 já não roda em CGA. O OS/2 2.0 não roda em XT. Aliás, não roda nem mesmo nos velhos AT 286 de 16 bits. E Windows NT também exigirá pelo menos um 386. E agora?

Agora, é parar e pensar. A turma do XT alega que ele basta. Nele pode-se rodar editores de textos sofisticados, planilhas capazes das simulações mais complexas e bancos de dados suficientes para as necessidades administrativas até mesmo de uma empresa de porte médio. Então, pra que mais? Se a máquina basta, para que trocar?

Há alguns anos eu trabalhei em um grupo responsável pelo projeto e controle de um empreendimento de porte relativamente grande. Executava-se, fiscalizava-se e controlava-se alguns mihões de dólares em obras. Tudo isto, evidentemente, com a ajuda de um micro. Rodando um editor de textos, uma planilha e um banco de dados. Quais? Wordstar, Supercalc e DBase II. A máquina? Um Unitron de 8 bits, 128K de RAM e winchester de 10Mb. E bastava.

Bastava mesmo. Com ela controlava-se tudo, de material a pagamento de faturas. Se quisessem, ela estaria até hoje funcionando e cumprindo suas funções com bravura, tenacidade e eficiência. No entanto, foi substituída por um XT. Hoje em dia, quantas daquelas máquinas ainda estarão em funcionamento?

Por favor, não me entendam mal: não quero provar que a tribo do XT está errada. Até concordo: se a máquina atende às necessidades, você pode mantê-la. Mas o problema tem duas faces. Pois, se a teoria do "pra que trocar" fosse levada às últimas conseqüências, até hoje estaríamos todos pilotando máquinas de 8 bits...

Trata-se de uma questão de evolução. Passou-se dos 8 bits para os XT em busca de mais memória, mais velocidade, maior capacidade de processamento. Mais conforto, enfim. Os XT, mais potentes, ensejaram o desenvolvimento de aplicativos mais poderosos. Que exigiam mais memória, mais velocidade, maior capacidade de processamento. Vieram os AT 286. Que, por serem mais potentes...

Sim, eu sei, fica-se como o cachorro que corre atrás do próprio rabo. Hoje, estou aqui batucando em um 486. Mas dentro de um ano, provavelmente, batucarei em um 586. Ou no que estiver passando agora pela mente dos magos da Intel, AMD ou seja lá quem for. Mas isso não quer dizer que todos precisam fazer o mesmo. A máquina é uma ferramenta. Se você acha que a sua executa satisfatoriamente seu trabalho, fique com ela. A menos que...

A menos que pretenda se aproveitar dos pequenos luxos que um micro mais potente propicia. A menos que já esteja se cansando de esperar um tempo que parece infinito enquanto a planilha é recalculada, a tela gráfica se renova, o longo arquivo é lido do disco. A menos que deseje utilizar as facilidades de uma interface gráfica como Windows ou a do OS/2. A menos que já esteja cansado de configurar cada programa para a sua impressora, e cada vez que troca de programa ou de impressora, começar tudo de novo. A menos que já esteja farto de ver sempre verde sobre verde em uma tela de miserável resolução. A menos que, enfim, pretenda dar mais conforto a si mesmo. Como quem troca de carro por um modelo mais novo, um pouco mais potente, ligeiramente mais confortável, mesmo sabendo que o velho ia a todos o lugares onde vai o novo...

Então, o que fazer? Bem, pessoas como eu, viciadas nessa máquina maldita, não têm outro recurso senão seguir compulsivamente acompanhando tudo que há de novo. Por vezes, tento enganar a mim mesmo, justificando que, por dever de ofício, preciso permanecer atualizado. Mas, no fundo, sei que é vício mesmo.

Mas e vocês, pessoas normais que sabem que o micro não é um brinquedo caro, mas uma ferramenta? Bem, nesse caso tenho uma sugestão que talvez seja razoável. Baseada no fato de que o micro não é uma ferramenta comum: é uma ferramenta que usa outras ferramentas. No caso, os aplicativos. Sem eles, a ferramenta emperra.

Então busque se manter em um ponto intermediário. Procure uma máquina que, mesmo não sendo a última palavra da tecnologia, possa rodar os programas modernos. É meramente uma questão de conforto e atualização. Esses aplicativos, aproveitando-se dos recursos dos novos microprocessadores, podem fazer muito mais, melhor e mais depressa que os da geração anterior. Os preços de hardware estão caindo tanto, que certamente o esforço vale a pena.

E, hoje, que máquina é esta? Bem, sem dúvida o grande salto foi do 286 para o 386. Nem tanto pelos 32 bits do último, mas sobretudo pelo modo protegido e capacidade de simular máquinas virtuais. Se tudo isto parece complicado, esqueça: tenha em mente, apenas, que a diferença de desempenho entre o 386 e o 286 é muito maior que entre quaisquer outras duas gerações sucessivas da linha Intel. E que um 386 pode fazer quase tudo que faz o 486 (e, provavelmente, que fará o 586), só que um pouco mais devagar.

Então, na minha modesta opinião, a máquina que hoje apresenta a melhor relação custo/desempenho é um 386. E, necessariamente com monitor VGA. Pode ser monocromático, mas nunca menos que VGA: já não se faz mais programas para os padrões anteriores.

Portanto, se você está satisfeito com sua máquina, fique com ela. Mas se vai trocar ou, melhor ainda, comprar a primeira, não pense em nada que não seja pelo menos um 386 com vídeo VGA. Quanto a mim, vou continuar como o cão correndo atrás do rabo. Só que cada vez mais depressa, com mais cores e melhor resolução...

B. Piropo