Escritos
B. Piropo
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11/12/1995

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Ao contrário de suas antecessoras ST-506/412 e ESDI, que eram interfaces de dispositivo, a ATA é uma interface de sistema (system level interface). A distinção é fundamental (embora pareça meio idiota já que tanto uma quanto outra funcionam como elo de ligação entre dispositivo e sistema): uma interface de dispositivo é desenvolvida apenas e especificamente para aquele dispositivo ao qual está conectada e não exige nenhum suporte por parte do sistema (além do suporte genérico aos dispositivos usuais de entrada/saída, evidentemente) enquanto uma interface de sistema é definida conjuntamente pelo o dispositivo e pelo sistema (no caso da ATA, pelo disco rígido e pela placa-mãe, ou mais especificamente pelo o BIOS da placa-mãe que deve conter o código de suporte ao padrão). As vantagens são muitas e serão discutidas em detalhes adiante, mas a maior e mais evidente delas é a transparência: não é preciso carregar um driver especial para usar um disco rígido ATA, já que todo o código necessário está incorporado ao BIOS (ou, no caso das placas-mãe antigas cujos BIOS ainda não incluíam suporte para ATA, a uma extensão do BIOS gravada em ROM e implementada na placa adaptadora encaixada em um slot do micro - o que vem a dar no mesmo já que as extensões são incorporadas ao código do BIOS tão logo a máquina é ligada). Por isso, quando se trata de discos rígidos ATA, você não precisa de se preocupar em "casá-lo" com uma placa controladora especialmente desenvolvida para ele e pode encaixá-lo em qualquer sistema que forneça suporte para a interface ATA.

A interface ATA foi uma evolução tão natural e vantajosa das velhas ESDI e ST-506/421 que dominou completamente o mercado desde o final dos anos 80. E se você estranhou ter ouvido falar tão pouco de uma coisa assim tão popular, relaxe: de ATA você provavelmente conhece mais do que pensa. E até sou capaz de apostar que você tem um disco rígido ATA em sua máquina. Como? Está propenso a aceitar a aposta porque seu disco rígido é IDE e não ATA? Pois não aposte que vai perder: ATA e IDE são exata e rigorosamente a mesma coisa. Achou estranho? Mas é isso mesmo. Veja lá:

IDE é o acrônimo de "Integrated Device Electronics", que quer dizer "Eletrônica Integrada ao Dispositivo" (ou seja: os circuitos de controle do drive estão integrados ao dispositivo e não a uma placa controladora, justamente a característica da interface ATA que discutimos a semana passada). E tem um apelo mercadológico muito maior que ATA. Por isso, lá pelos idos de 1986 quando começou a pensar na sua nova interface, a Compaq já se referia a ela como IDE. E assim batizou a interface que desenvolveu em conjunto com a Western Digital e com a divisão de dispositivos magnéticos da Control Data (que mais tarde virou Imprimis e acabou incorporada à Seagate) para o Compaq Portable II, um mastodonte para os padrões atuais, mas um micro portátil e que portanto exigia soluções próprias e compactas. Entre elas, suporte a disco rígido incorporado ao BIOS da própria placa mãe, já que a idéia básica era eliminar uma placa controladora levando a eletrônica de controle para o próprio drive e "poupando" um slot.

Essa primeira tentativa foi um tanto canhestra. O disco rígido era um trambolho da Control Data do tamanho de um drive de disquetes de 5"1/4 e armazenava apenas 40Mb. Seu controle estava embutido no drive, é verdade, mas muito pouco integrado: era quase uma controladora independente da Western Digital cujos circuitos foram retirados da placa e levados para junto do drive. E, se bem que não usasse um slot, também não se conectava diretamente à placa-mãe mas a uma placa multifunção (a primeira multi I/O) esta sim, espetada em um slot (como você vê, o conceito de micro portátil evoluiu um bocado nestes últimos dez anos). Mas foi o primeiro passo de uma caminhada bem sucedida. Tanto que outros fabricantes logo adotaram a idéia. E como não havia padrão, cada um a desenvolveu como achou melhor e logo uma babel desenhou-se no horizonte.

Mas isso não interessava a ninguém. Veja lá: a maior das vantagens da nova interface era justamente a transparência, pois sendo uma interface de sistema suportada diretamente pelo BIOS, podia esconder todos os detalhes da geometria interna do drive. Isso quer dizer que, se fosse devidamente padronizada, permitiria que drives de diferentes fabricantes funcionassem juntos e conectados a sistemas (placas-mãe) de distintos fornecedores. A materialização, portanto, de um conceito que é o sonho de todo usuário e de grande parte da indústria: compatibilidade. Tudo o que faltava para isso é que os fabricantes de discos rígidos e de micros (mais especificamente, de placas-mãe) se juntassem e se pusessem de acordo sobre a forma pela qual os sistemas poderiam acessá-los. Ou seja: faltava estabelecer um método de acesso comum.

Assim, em outubro de 1988, os principais interessados (as empresas que fabricavam discos rígidos e as que os usavam em seus micros) reuniram-se e formaram um comitê. Que, ao contrário do que costuma acontecer nessa indústria que exibe uma curiosa preferência por acrônimos esdrúxulos, chamou-se singelamente CAM (Commom Access Method Commitee) e formulou as especificações da nova interface em março de 1989. Que foram prontamente adotadas pela indústria ávida por um padrão. Em novembro de 1990 essas especificações, já em uso, foram formalmente apresentadas como proposta de padrão ao ANSI (American National Standard Institute, órgão oficial de normalização americano) e em 1991 aceitas como padrão oficial. Como o que se padronizava na verdade era uma interface para conexão de discos rígidos ao barramento desenvolvido para os velhos AT da IBM, o barramento ISA de 16 bits (sim, existem "placas controladoras IDE" para os barramentos MCA e PCI, mas são adaptações quase que obrigatórias devido ao enorme sucesso do padrão), o comitê CAM batizou a nova interface de Conexão AT. A nossa velha conhecida AT Attachment, a ATA.

E é por isso que ATA e IDE, quem diria, são rigorosamente a mesma coisa.

PS: Amanhã, dia 12, segunda terça-feira do mês, a última e festiva reunião do Grupo de Usuários de OS/2 do ano. Como sempre no Rio Data Center da PUC, na Gávea, as 19hs.

B. Piropo